James já fez alguns jogos a jogar na posição “dez”. De início ou porque Vitor Pereira assim o colocou durante a partida. E o que fez nesses jogos foi bastante acima da média, com passes a rasgar, desmarcações quase perfeitas, dando mobilidade e clarividência ofeniva a um meio-campo que peca por vezes por excesso de contenção e com poucos rasgos individuais, privilegiando a posse em detrimento da irreverência. Nada contra a primeira ou a segunda, desde que tragam resultados. Mesmo com James a jogar na linha, é frequente vermos o colombiano a vir atrás recolher a bola, criando jogadas ofensivas através da rotação para o flanco oposto, por combinações com Lucho e/ou Moutinho, integrando-se na manobra imaginativa da equipa e transfigurando em grande parte o jogo que é por si movimentado e dinamizado.
Tudo muito bem. Mas, e há sempre um “mas”, o que vai acontecer quando as coisas correrem mal? Assim mal, mesmo mal? Quando não sair um passe em condições porque ficam muito curtos ou longos demais, ou quando o relvado fôr difícil de combater ou o adversário rijo demais para contornar ou ultrapassar? Quando passar um jogo inteiro a procurar espaços na armadura contrária sem os descobrir? Quando o ponta-de-lança disser alhos quando o prato do dia eram bugalhos?
James vai sofrer, garanto. Vai carregar aos ombros o peso que Deco, Hagi, Laudrup, Sócrates, Rui Costa, Zidane e tantos outros tiveram de carregar. A desventura de uma noite em que nada parece fazer o “click” certo para a exibição ser positiva. Aqueles jogos em que por muito talento que o rapaz tenha nos pés e na cabeça (e tem, é certo), por muito esforço que coloque em campo, nenhum pontapé vai ser produtivo, nenhum lance vai ter bom resultado, nenhuma tentativa vai ser bem sucedida. E sei, porque a experiência já mo mostrou muitas vezes em muitos jogos, nem sempre o artista encontra compreensão por parte do público que exige dele o que já viu um dia a fazer, noutro tempo ou noutro local. E temos de nos habituar a que nem sempre acontece o que queremos e temos um excelente exemplo em Belluschi, onde a regularidade competitiva era tão ausente que ninguém sabia muito bem o que esperar dele, mas quase todos tinham a certeza que não podíamos contar com três ou quatro jogos seguidos em alto nível porque nunca aconteceu. Um número dez é isso, um dependente da inspiração momentânea, um mago que transforma uma jogada perdida numa assistência para golo, um génio que consegue fazer em dois toques e outros tantos segundos o que outros não conseguem numa vida inteira de treino e expectativas consistentemente frustradas. Falha passes porque os tenta, pede a bola porque quer tentar de novo e se falhar de novo, logo se reinicia o ciclo e se procura outra vez arrastar a nora para que o grão seja moído com o tamanho certo para a altura certa.
E a natureza humana diz-me que até um bom número dez é quase impossível de tolerar durante muito tempo caso não tenha o rendimento que todos esperam dele…a não ser que os adeptos estejam treinados para o fazer. E o mais provável é que o FC Porto não está pronto para ter um “dez” se a vida não lhe correr bem durante alguns jogos consecutivos. Dou a palavra aos adeptos. Provem que estou enganado.