Foi uma espécie de jogo de gato e rato. Adaptando a metáfora, convém dizer que o gato era um tigre daqueles grandalhões, cheios de força e pujança física mesmo depois de acabarem um saboroso repasto, que mantiveram um tipo de rato esfomeado que usava as pequenas unhas para tentar arranhar o potente felino, ficando quase sempre longe de fazer um mínimo arranhão na pele do adversário. O gato…tigre, perdão, deixou o rato lutar, cansar-se, trabalhar como uma lenta cigarra desde o início e enfiou-lhe uma manápula no lombo logo no arranque da brincadeira. Mas o ratito, com mais força que todos os outros ratos com quem habitualmente passa os tempos, olhava de baixo para o tigre e espreitava o melhor sítio para lhe procurar as falhas. Não havia. O tigre deixou-se estar dentro da jaula com a chave na porta, até que se fartou e investiu. Duas. Três. Quatro vezes. E o rato recuou, exausto. Tinha feito o que podia. Não chegou, nunca chegaria. Vamos às notas:
(+) Vontade apesar da incapacidade Um golo aos vinte segundos é uma traulitada nas têmporas que ninguém merece. Talvez Otamendi, pela estupidez (já bastante repetida, infelizmente) do passe de ruptura quando os colegas da defesa estão mal colocados, mas o argentino levou o pagamento pela parvoíce na forma de uma patada de um colega. Teve azar, nas duas situações. Mas ninguém notou que tínhamos sofrido o golo e mesmo com a permissividade do City ao deixar-nos organizar o jogo como queríamos e apesar das situações de golo terem sido poucas e sem grande perigo, a verdade é que pegamos no jogo. Aos trambolhões, com a lentidão que as equipas portuguesas insistem em não querer mudar especialmente quando lutam contra britânicos, mas a bola estava nos nossos pés. E tivéssemos tido alguma sorte no jogo e uma bolinha lá tivesse entrado na baliza do albino titular da Inglaterra e a história podia ter sido diferente. Gostei de James, a recuar para vir buscar a bola. Gostei de Alex Sandro e Varela, a usarem bem o overlap pelo flanco esquerdo. Gostei de Moutinho e Lucho, que rodavam a bola de um lado para o outro à procura de espaços para furar. Gostei de Fernando, a tapar. Gostei de Maicon a aliviar. Gostei, pronto. Deram-me esperança, ténue, mas umas raspas de fé que era tão curta e tão necessária. Não foi esplêndido, não foi brilhante. Mas foi esforçado.
(+) Hulk É muito fácil, cada vez mais fácil culpar Hulk pelos maus resultados. E já houve jogos em que a insistência do brasileiro nos tramou as chances de podermos conseguir golos ou melhores exibições. Mas é penoso ver o rapaz a receber a bola com quarenta oponentes pela frente sem ter nenhum colega para o apoio rápido, nem que seja para lhe retornar a bola quando estiver numa situação impossível de transpôr. Maicon ou qualquer um dos laterais direitos TÊM de aparecer perto dele para que possam receber o esférico quando o rapaz não consegue furar pelas barreiras do adversário e como raramente acontece lá vai o moço como um tolinho a tentar desfazer os defesas. Ora quando os defesas são bons ou têm bom apoio…nada a fazer. Hoje lutou, tentou, rematou…mas não conseguiu melhor. Inúteis também os cruzamentos quase rasteiros para a pequena área quando não havia ninguém para empurrar para a baliza. Pois. Mas a culpa não é dele.
(+) Fernando Pouco mais há a dizer sobre uma nova excelente exibição de Fernando. Acho que posso afirmar com alguma certeza que é a última temporada do rapaz no FC Porto, porque é muito complicado manter no nosso campeonato um dos melhores jogadores do mundo naquela posição. Muito bem.
(-) Lentidão e falta de poder de choque Compreendo que Touré, Richards, Kompany e Lescott sejam grandes. Feios. Brutos. Rijos. Altos. Homens, pronto. Não me custa compreender como é que grande parte dos duelos que se travam entre os nossos jogadores e estas montanhas de granito tendam a ser vencidos pelos canastrões. Mas o que me desafia os poucos neurónios é que o mesmo acontece quando está Nasri, Silva, Aguero ou Clichy em vez de qualquer um daqueles nomes de cima. A velocidade de execução é baixa, sabemos disso e até podemos tirar partido disso, transmitindo uma espécie de falsa calma que se pode alternar com bons passes a desmarcar os jogadores mais rápidos do ataque (Hulk, portanto), mas a incapacidade de lutar no um-contra-um é assustadora. Veja-se o exemplo do Braga, com jogadores que têm capacidades físicas sensivelmente iguais às nossas…mas que diabo, os rapazes parecem ser mais lutadores. Conformismo ou fraqueza mental? Deixo-vos decidir.
(-) Ingenuidades Um dos mais invulgares e inesperados happenings é a ingenuidade de alguns jogadores do FC Porto em 2011/2012. Hulk cai demais, Otamendi falha passes parvos, Rolando reclama demais, Varela parece tratar a bola como um paralelo de calçada aos saltos. E o miúdo Alex Sandro, apesar do bom jogo, voltou a exibir algumas inconsistências mentais que não podem acontecer a este nível. Perdemos, é verdade, mas a quantidade de bolas que desperdiçamos com passes inconsequentes, maus domínios de bola e desorganização estrutural é abismal e não se entende.
Foi-se. Defender o troféu acabou por ser um gigantesco sonho que foi arrasado por uma excelente equipa inglesa de nome e universal em talento. Não tendo caído de pé mas a cambalear, a chamada à razão de todos os que não acreditavam que seria possível ir a Manchester vencer o jogo acaba por ser a pedra mais pesada do cinismo da realidade que é habitualmente contrariada pelos sonhadores como eu, que se dignam a ver os jogos do FC Porto até ao fim. Mesmo com quatro na pá. É isto, meus amigos, é aguentar os gozos dos moços que apoiam os outros clubes, sorrir e voltar ao combate. E reafirmo o que disse ontem: não me custa perder por quatro. Fiquei com a noção evidente que os rapazes tentaram. Só que não conseguiram o objectivo com um misto de mérito adversário e demérito próprio. Fizeram por isso. Palmas.