Os meus quatro Onzes – Parte II

Começo a segunda era dos meus quatro onzes, a que chamei “CAS, Robson e Penta – De 1991/1992 a 1998/1999“, com uma pequena viagem pelos meus inícios de vida portista. Foi nesta altura, mais precisamente na primeira temporada a que esta era diz respeito, que comecei a ir com alguma regularidade ver o FC Porto a jogar nas Antas (e alguns jogos fora), servindo como intronização para o que é agora um hábito de tantos anos. Aqui está aquele que considero o melhor onze deste período, incluindo os actores nada secundários nos diversos plantéis que compuseram as equipas do FC Porto:

Baía na baliza, com Silvino (que foi o único outro guarda-redes deste período que me deu alguma segurança na baliza. Nem Rui Correia nem Hilário (ambos fizeram mais jogos e seriam escolhas mais naturais, mas o “velhote” era mais seguro), muito menos Wozniak, Costinha ou Kralj. O quarteto defensivo pode criar alguma  contestação. João Pinto é a escolha natural e meritória para lateral direito com Secretário a ficar longe e Rui Jorge foi o defesa esquerdo titularíssimo até Fernando Mendes chegar. Os centrais, Aloísio e Jorge Costa, eram garantia de segurança, de força, de coesão e de complementaridade. Foram grandes e nem José Carlos e Fernando Couto, ambos com valor suficiente para fazer parte de tantos “onzes-tipo”, não conseguem, na minha opinião, destronar esses nomes.

Nos médios, as escolhas de Paulinho Santos e Rui Barros eram óbvias, já Zahovic bateu Timofte por muito pouco, apenas pela influência que teve na equipa durante mais tempo. Semedo e Sérgio Conceição, elementos de muitos anos de portismo em cima, foram muito importantes em diversas conquistas mas não os conseguia colocar na frente de qualquer um dos outros três nomes.

Na frente, não tenho dúvidas. Apesar da injustiça feita para com Domingos, que não figura no onze-base de nenhuma das eras que seleccionei, a verdade é que Jardel não dá hipótese a ninguém pela importância que teve desde que chegou ao clube em 1996/1997. Foi um dos melhores avançados que vi a jogar, sempre ajudado por Drulovic e Capucho, sem os quais não teria marcado metade dos golos que apontou. Folha e Artur, também com nome gravado no hall of fame portista, ficam de fora quando comparados com os dois nomes que formaram um dos melhores tridentes ofensivos da história do FC Porto.

Como na edição anterior, há muitos pontos de discordância, por isso venham de lá os comentários.

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Onze onzes de onze portistas

Com a sondagem que o FC Porto lançou para os adeptos elegerem o melhor onze de sempre do FC Porto (no site oficial, no Facebook oficial ou via email para [email protected]), decidi recolher alguns onzes ideais de vários portistas, entre bloggers, ex-bloggers…e Pinto da Costa.

Os nomes que estão com fundo azul são os que reuniram maior consenso e que estarão então em bom caminho para figurarem na lista do melhor onze de sempre. A melhor equipa do FC Porto seria então:

Vítor Baía, João Pinto, Aloísio, Ricardo Carvalho, Branco, André, Deco, Lucho González, Madjer, Futre, Gomes

Reparem que ninguém se limitou aos nomes propostos pelo clube e usaram os próprios critérios para selecção dos jogadores, atitude que aprovo a 100%. Eu próprio, aqui há uns anos, fiz o mesmo num exercício curioso que agora revejo. Olho para o onze que escolhi e percebo que devia estar semi-alcoolizado na altura. É injusto escolher apenas onze jogadores e há tantas formas diferentes de abordar uma questão deste género (Como é que se diferencia entre Rodolfo e André ou Paulinho Santos? E Jardel, Gomes e Falcao? Quantos é que ainda viram o Virgílio, o Hernâni ou o Barrigana a jogar? E temos de escolher só onze?!) que seguindo o mesmo critério (em 2013, pelo menos), equilibrar o talento bem como o contributo para a história do clube torna-se quase impossível.

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Baías e Baronis – FC Porto 1 vs 0 Celta Vigo

Welcome back, FC Porto. Mais ou menos. A festa foi porreira, alegria nas bancadas, o estupor do dragão a fazer barulho durante vinte minutos, a saudação aos novos e aos antigos, a recepção ao treinador estreante, a simbiose de euforia e boa disposição que faz dos inícios de época um bom momento para todos os presentes. Mas eu, em casa, só vi um jogo tristonho, com jogadores empenhados mas cansados, a precisar ainda de suficientes sessões de treino para se poderem unir de uma forma condizente. Gostei de algumas coisas, não gostei de outras. Vamos a notas:

(+) Lucho. Continua a ser o mais inteligente dos jogadores do FC Porto, pela forma como está em campo e como coordena a manobra da equipa. Se vai continuar a jogar naquela posição, de desgaste permanente e de pressão constante quase na área contrária, vai-se queimar rapidamente mas acaba por compensar com a grande maioria dos passes certos na altura certa que insiste em completar. Bem-vindo de volta, Comandante.

(+) Fucile, a defender. Esforçadíssimo, a mostrar que está pronto para jogar tanto do lado esquerdo como do lado direito da defesa, sempre ao mesmo ritmo, que neste momento não é ainda muito mas espero evolua num futuro próximo para níveis habituais, pelo menos há uns anos atrás. Não lhe correram bem as coisas no ataque, mas esteve bem defensivamente e fiquei satisfeito pela recepção que teve da parte dos adeptos.

(+) A terceira camisola, apesar de não gostar do design. A manobra de marketing é lógica e peca por tardia. No ano passado, depois do jogo em Zagreb, a terceira camisola em tons de branco causou um impacto tão grande nos adeptos que a preferiram em grande escala quando comparada com a alternativa “oficial”. Este ano, para celebrar os 120 anos da nossa fundação, a Nike e o FC Porto decidiram avançar com mais uma peça de merchandising logo de início e espero vê-la à venda nas Lojas Azuis muito em breve. Não sou o maior fã do design (não sou fã de grandes inovações em termos de layout, mas parece-me…simplista em demasia) mas aprovo o processo.

(-) Muitas falhas defensivas e poucas chances criadas. Sim, eu sei que é início de época e a concentração não é a melhor. Some-se uma equipa ultra-defensiva e uma segunda parte com montanhas de alterações e temos um caldinho para a ineficácia que nos transformou em mais latinos que nunca. Mangala e Otamendi tiveram falhas grandes, mas também Maicon e Fernando estiveram desconcentrados atrás. Na frente, Iturbe falhava cruzamentos como se tivesse tantos anos quantos estão estampados nas costas, Josué tentava passes a mais com pontaria a menos, Kelvin não passava por um único adversário e Varela…esteve ao nível de há dois anos atrás. Há muito tempo para trabalhar e sangue para oxigenar, mas é de início que se devem começar a mostrar boas coisas, para evitar que os adeptos mais nervosos…se enervem nas piores alturas.

(-) Kelvin, pela atitude em relação a Nolito. Talvez pense que não fez o suficiente para se tornar um ícone dos adeptos no ano passado e ache que será assim que vai continuar a somar pontos, com aquela atitude parva de quase agredir um ex-jogador do Benfica. Não foi digno, sinceramente, e mais parecia um miúdo birrento num jogo de rua. Se fosse o Paulinho Santos a fazer aquilo, até o perdoava, porque sempre agiu da mesma forma e só seria fiel ao seu estilo e coerente com a atitude. Kelvin, por outro lado, não é gajo para aqueles festivais. Podia ter estragado o espectáculo.


No fundo, foi mais do mesmo para jogos de apresentação. Raramente a equipa está em níveis aceitáveis, o entrosamento ainda falha, há muitos passes falhados e o onze-base ainda nem estará decidido. Nesta altura exige-se trabalho e não grandes resultados, muito menos grandes exibições. Vamos ter uma época inteira para isso…

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Reductio Ad Iacobus


Para terminar a saga de reduções nada absurdas (see what I did there? Gold, Jerry! Ahhh…), consideremos o caso final de malícia e cinismo ao extremo, que se prende com a concentração de tudo que nos acontece de bom ser feita na figura de um único homem. Este Deus olímpico, como Thor com o martelo ou Shiva com os braços e as chamuças ou os amendoíns ou lá que raio é que a divindade usava como munições letais, é o singular responsável pelos resultados positivos do FC Porto, quer pratique a sua arte em zonas mais avançadas ou até na rectaguarda do campo, agindo como a única força-motriz das vitórias sem que o resto da equipa tenha uma mínima intevenção no normal desenrolar do processo.

Há anos que ouço estas patranhas a serem avançadas como verdades por uma enorme maioria de fervorosos adeptos de outros clubes, normalmente os que se reunem em cafés manhosos com relógios do glorioso deles na parede, fotografias de Pinto da Costa vestido de recluso ou calendários Pirelli já desfeitos pela idade, o sol, algum suor e um inenarrável manto de lágrimas. A teoria é lançada com uma espécie de louvor às qualidades do jogador quando os laços ainda não o amarraram ao nosso clube. Futre, Drulovic, Jardel, Costinha, Deco, McCarthy, Anderson, Lisandro, Álvaro Pereira, Hulk ou James, o mais recente enaltecido pré-Dragão. São jogadores, passo a citar, “do caralho“, que brilham com uma luz interior pura e intensa, espalhando classe por tudo que é relvado, grandes perspectivas para um futuro genial, rodeado de modelos suecas e douradas coroas de louro a graçar as suas magníficas testas. Até que, por obra e graça dos olheiros do nosso clube e/ou capacidade negocial com maior acuidade, acabam a assinar pelo FC Porto. O futuro venturoso ainda não desapareceu, atente-se, porque ainda são grandes jogadores nesta altura, mas já estão tingidos pelo mal, pela penumbra, pelo azul-e-branco. E à medida que vão começando a mostrar o que sabem, cedo se transformam no “gajo que só joga com o pé esquerdo“, “o outro que só passa com a parte de fora do pé, parece parvo“, “aquele gajo que só empurra lá para dentro e nem sabe como é que a bola lá chega“, “caceteiro que só dá lenha“, “parece que nem sabe correr“, “é só noitadas, o boi, nem sei como é que chega sóbrio aos jogos“, “o puto que teve de trazer a mãe porque nem sabia andar de autocarro“, “o simulador de penalties“, “o tipo que nem centrar sabe e tem uma boca que parece um peixe“, “o gajo com nome de super-herói que devia andar mas era no jujitsu” ou, como já tenho ouvido, “o menino que nem humilde é e andou aí um ano sem tocar na bola e agora acha que é o maior mas é só prás gajas“. Todos são uma merda depois de mostrarem que não o são.

E o resto das descrições é o do costume, porque só eles é que jogam e só jogam porque os deixam jogar, como se uma equipa fosse composta por um gajo e os outros lá andarem como bullies num recreio em que só permitem que um rapaz (E SÓ ELE!) possa tocar na bola e fazer o que sabe melhor fazer. E esquecem-se que para cada Futre havia um Magalhães e um André, um Paulinho Santos e um Rui Filipe para cada Drulovic, um Capucho e um Zahovic para cada Jardel, um Maniche e um Pedro Mendes para cada Costinha, um Paulo Ferreira e um Nuno Valente para cada Deco, um Jorge Costa e um Derlei para cada McCarthy, um Raul Meireles e um Pedro Emanuel para cada Anderson, um Lucho e um Paulo Assunção para cada Lisandro, um Sapunaru e um Fernando para cada Álvaro Pereira, um Otamendi e um Belluschi para cada Hulk e um Moutinho e um Varela para cada James. Deixem-me respirar um bocadinho…já está. E que cada um destes nomes teve um papel a representar, mexendo com a equipa, abanando as fundações do adversário, trocando a bola, criando espaços, fazendo o trabalho táctico para que o génio se possa perder menos na transpiração e aplique as forças na inspiração. Todos eles são importantes mas a poucos lhes é dada o mérito que a valia os devia fazer receber. É o tradicional “todo pela parte” que já me habituei, em que os (poucos) cabeçalhos de jornais só enfatizam quando algo se passa de errado com o jogador ou com a equipa, em que se agride moralmente porque são os elos mais fracos, os nomes menos falados e alvos menos apetecíveis.

É assim e sempre será neste mundo de falsidade vendida a peso: os James deste mundo terão sempre o destaque e os Ruis Filipes só têm honras de capa quando dela menos precisavam.

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Another time, the same place

25 de Setembro de 1994.

Estava uma tarde amena mas pouco solarenga na Invicta. Estava sentado na Superior Sul do Estádio das Antas, ao lado do meu amigo daquelas andanças, pronto para mais um espectáculo que se esperava épico, como todos os eventos a que se assiste quando se é adolescente e nada cínico, onde o mundo é uma ostra pronta para ser aberta pelas delicadas mãos de um rapaz que anseia viver, conhecer, sentir. Que lírico que eu era, meu Deus. Entre conversas, anedotas recorrentes e mais uma mijadela antes de entrar para o campo, espera-se pelo início da partida. A equipa da casa, com as belas camisolas azuis-e-brancas, irrompe do túnel com a tradicional pujança do Dragão (o animal mitológico, entenda-se), acompanhados pelos suplentes e pelo treinador, um amável e entusiasta do futebol, “sir” em título e “mister” de profissão, Robert William Robson. Bobby para todos, não só para os amigos. João Pinto, tocado e poupado, juntamente com Aloísio. Tinha havido jogo contra os polacos do Lodz durante a semana e íamos à Polónia defender a vantagem de dois golos a meio da próxima, antes de jogarmos contra o Benfica na Luz passados oito dias. Semana difícil, dura, rija, com Rui Filipe ainda na cabeça e o calendário sem misericórdia para lamentos.

Mesmo com todas estas condicionantes, no onze havia grandes nomes, grandes vultos do nosso então presente. Baía na baliza, com a camisola garrida do costume. O “Bicho” na defesa, ao lado de José Carlos, o reserva que seria titular em qualquer equipa menos na que tinha Aloísio para o seu lugar cativo. Secretário substituía o capitão e Rui Jorge cobria o flanco esquerdo. No centro, Kulkov construía e Paulinho Santos destruía. Brahma e Shiva, lado a lado. Pela direita seguia Jorge Couto, à esquerda Drulovic. Talento, tanto talento. E na frente, a dupla improvável: Rui Barros e Yuran, com a velocidade do lusitano a complementar a força do soviético. E no banco ainda estavam Cândido, Domingos, Emerson, Latapy e…Baroni. O não-tão-saudoso peruano que já na altura me fazia pensar: “Hei-de te imortalizar, Ronald, vais ver!”.

O jogo começou, lento, chato. A produção era pouca, parcos remates, o tempo ia passando e os doze mil nas bancadas lançavam um enorme bocejo entre eles. E eu, ali sentado, temia que perder pontos tão cedo na época (afinal íamos apenas na quinta jornada) nos podiam começar a atrasar na luta pelo campeonato que na altura não era nosso. Era deles. Era do Benfica. Havia de ser nosso novamente, mas naquele momento tinha fome de títulos. Robson, gritando a partir do banco, dilacerando a lusa língua antes de quaisquer acordos, inventando palavras que só ele sabia pronunciar, tentava animar a equipa. Mas nada feito. O intervalo chegava e o nulo era óbvio, entediante, aborrecido, justo. Sir Bobby, dinâmico nas substituições como raramente o fazia, faz sair Jorge Couto e entrar Domingos para a segunda parte. Nem um minuto foi preciso para que o “nove” que na altura foi “quinze” (porque os números ainda não eram fixos) enfiar a bola na baliza de Álvaro e erguesse o estádio numa onda de alegria. Dois minutos depois e Rui Barros, pequeno em estatura mas gigante em alma e querer, lá fizesse subir o marcador mais uma vez. Don Pasolini nos altifalantes, pneus Kleber para meio mundo, Dancing Queen a tocar e siga a rusga. E o jogo morreu de novo. Os jogadores pararam de jogar, de correr, de suar, porque noventa minutos é tempo para cansar um pedaço e ainda temos uma viagem ao leste e depois à Luz, oh mister, aguente lá os horses.

Acaba o jogo. A malta, satisfeita com o resultado mas desgostosa com a exibição, começa a sair para o final de tarde domingueiro, a caminho das suas famílias, dos carros, dos restaurantes. Mas…que se passa no relvado? Olho para o relvado e vejo que o Zé, o adjunto/tradutor do “mister”, está a chamar os moços todos porque o treinador quer falar com eles. “Então o jogo já não acabou?!”, perguntam alguns a meu lado. “Sei lá, amigo, parece que não!”. Entram as bolas, juntam-se os moços ao centro, uma conversa rápida com Robson aos gritos, e começa tudo a correr em formação. Treino físico, parecia. Mas como?! Depois de um jogo? Se houvesse uma altura em que pudesse ter ficado qual figura de cartoon com o lábio inferior a cair para me bater nos joelhos, esse era o momento certo.

Mas o que vi foi muito simples: o treinador da minha equipa, quando viu que os seus rapazes não se esforçaram o suficiente durante o jogo, não gostou. O público não merecia e ele muito menos, por isso puniu-os, à vista de todos. Mostrou a toda a gente que quis ver e que ficou a olhar boquiaberta para o que se estava a passar, que com ele aquilo não podia acontecer. O esforço tem de ser máximo, os “cento e vinte percent” que Robson tantas vezes gostava de dizer, era essa a percentagem que queria ver em campo.

No passado Domingo o estádio era outro. O tempo era outro. As pessoas são outras. Mas se ainda tivéssemos a mentalidade de Robson, ter-se-ia passado o mesmo. Robson foi campeão à custa de talento, força e muito suor. Quando os jogadores não queriam, Robson obrigava-os a querer. Vitor Pereira ainda não fez o mesmo. Não sei se terá tempo de o conseguir.

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