Baías e Baronis – Rio Ave 2 vs 5 FC Porto

foto retirada de desporto.sapo.pt

As expectativas não eram altas. Mas as únicas e quase inacreditáveis condições para este jogo tornaram-no especial, querido, adorável. Muitas mudanças em relação ao onze habitual, um clima de paz e de tranquilidade nas bancadas e em todos os adeptos à volta do mundo que viram a partida, um jogo à tarde, com sol, calor e luz natural…todos estes estranhíssimos condimentos que prepararam esta última jornada do campeonato juntaram-se numa amálgama perfeita para uma tarde bem passada. Não fui a Vila do Conde mas lamento não o ter feito, porque tinha valido a pena saciar a curiosidade sobre as corridas dedicadas de Djalma, a sobriedade de Danilo, a reencontrada garra de Varela, a inteligência no passe de James e o fraquíssimo jogo de pés de Bracalli. Desculpa, Rafael, mas é verdade. A somar a isto ainda valeu pelo constatar que pelo menos um dos moços que hoje jogou de verde e branco para o ano tem obrigatoriamente de fazer a pré-época trocando o verde pelo azul: Atsu. Quanto mais não seja para entrar na lista de “mais um extremo que vamos aproveitar durante dois meses e depois cuspir para o Braga ou para qualquer outro lado”. Bem, vamos lá às últimas notas portistas do ano:

 

(+) Varela Ah grande Silvestre! Então esperas pelo último estuporado do último jogo para fazeres o teu melhor jogo de todos?! Que rapaz misterioso e sagaz me saíste, meu caro! Mas já não foi nada mau, lutaste e empenhaste-te cheio de vigor e de energia para mostrar aos adeptos que estás cá para impôr a ordem de Varela na próxima temporada! Ou talvez não e apenas te apeteceu sair do clube que te reprojectou para o mundo da bola com um agradecimento por três anos de variável produtividade. Não sei. Mas obrigado pelo jogo, valeu a pena.

(+) Kleber E sai mais uma imagem direitinha da Twilight Zone. Apresento-vos o caso de Kleber, o homem que no último jogo da temporada marca metade do número de golos que até lá tinha apontado. É tão curioso ver a forma atabalhoada como o brasileiro parece movimentar-se na área mas contrastar essa aparente inépcia com o bom domínio de bola e remate pronto. Quase sempre torto, mas pronto. Ninguém esperaria tanto deste moço hoje à tarde e só queria tê-lo visto a mexer-se tanto e com tanta eficácia desde Novembro. Não se pode ter tudo.

(+) Vitor Pereira Dois pequenos grandes gestos. Escalpelizo: a colocação de Hulk ao banco e a entrada de Iturbe e Kadu. A primeira porque mostra ao mundo que tem a perfeita noção acerca do que deve consistentemente transmitir para fora, que a equipa é mais importante que as individualidades. Quer Hulk saia, quer não, será sempre a “parte” que terá de submeter ao que o “todo” exigir e Hulk sabe disso mas não faz mal nenhum mostrar a todos que é assim que tem de ser. O próprio Hulk percebeu e não “espingardou”. E o facto de ter colocado Iturbe em campo para os adeptos verem quarenta e cinco minutos de infrutíferas e ingénuas tentativas de um rapaz que pode ter vontade mas que ainda lhe falta muito para conseguir jogar na Europa a um nível aceitável foi exactamente isso, uma prova que ele sabe o que está a fazer. E no caso de Kadu foi justo, simplesmente justo. E merecido para um rapaz que nunca saberá se vai de facto ter uma carreira no FC Porto ou não. Mas já fez por merecer olhar para trás daqui a umas décadas e dizer: “já fui campeão”.

(+) Atsu, quando olhamos para Iturbe Rápido, prático, eficaz, objectivo, audaz, vivo, inteligente, irreverente. Certinho no plantel 2012/2013. Pelo menos na pré-época. Este pequeno parêntesis sobre um jogador deles que afinal é nosso e que até nos marcou um bom golo é simples: temos valor em casa. Por favor vamos aproveitá-lo em condições.

 

(-) Iturbe, quando olhamos para Atsu Complicativo, inconsequente, ineficaz, triste, tosco, lento, fraco, mortiço. Não sei se fica no plantel 2012/2013. Parece fácil avaliar as coisas ao fim de 45 minutos mas a imagem que passou foi esta. É lógico que o que vimos não é Iturbe, não pode ser Iturbe. Ou melhor, Iturbe não pode ser aquilo. Tem de crescer e a jogar é que vai aprender a evoluir e a adaptar-se a um futebol que parece tão distante para ele como Quinzinho de Falcao. Mas o tempo urge e Iturbe tem de começar a mostrar serviço. Será na próxima temporada, estou com fé que sim.

 

Fechámos bem o pano e os rapazes vão de férias com todo o mérito. Excluindo os que ainda estarão no Euro ou nos Olímpicos, o resto do povo vai pousar as chuteiras no armário, guardar as meias e as ligaduras, desligar o despertador e avançar para as terras-natais com um sorriso completamente merecido. E nós, os que ficam deste lado, podemos descansar um bocadinho também. O tempo é de balanço, de recuperação mental e de acalmia nos comentários histéricos dos últimos meses. Vão de férias, dragões. Todos estamos a precisar de parar um bocadinho…só que as competições não param e o Euro está a chegar e depois os Olímpicos. Raios partam o calendário.

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Ouve lá ó Mister – Rio Ave


Amigo Vítor,

Agora que o campeonato luso está definido um pouco como o Lineker fez ao campeonato do Mundo com o FC Porto a fazer o papel dos indefectíveis teutónicos, chega a altura do último jogo e por muito que queira manter uma cara séria, é-me difícil tentar perceber se hoje vamos ter um jogo a brincar ou se realmente os rapazes que vais fazer subir ao relvado não estão já com a cabeça em mojitos, areia e fins de tarde solarengos só de avental e um fogareiro com as brasas bem acesas e dez nacos de carne na grelha. Chama-me louco mas não me acredito que nenhum deles pense em mais que um treino ao fim da tarde sob o sol de Vila do Conde.

E tu…também acredito na mesma coisa. Por isso é que não me preocupo muito com o resultado de hoje e apesar de ninguém querer perder mesmo a fechar o proverbial pano, estou convencido que metade dos portistas nem se vai preocupar em ver o jogo. Eu vou ver porque sou uma pessoa doente da cabeça mas disso já sabes porque já viste do que a casa gasta e nem aquele jogo-treino contra o Tourizense que costuma marcar o arranque das nossas pré-épocas me passa ao lado.

De maneira que sugiro que os mandes lá para dentro para se entreterem. O Brito vai fazer o mesmo, vais ver, porque ninguém quer agora lesões nem chatices, por isso tentem fazer meia-dúzia de jogadas bonitas e depois vão todos jantar ao Cangalho ou ao Ramón, tirem a barriga de misérias e façam do futebol a festa que todos queremos que seja. E aproveita para ir de férias descansado, deixa que o balanço faz-se mais tarde. E um dia destes vou aparecer lá por Espinho para te dar um abraço, rapaz. Mereceste.

Sou quem sabes,
Jorge

 

APOSTAS PARA HOJE NA DHOZE:

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Tempos modernos

No sábado à noite, depois de terminado o jogo e enquanto esperávamos que os jogadores se vestissem, retocassem a pintura que ostentavam nos respectivos focinhos, pintassem os focinhinhos dos filhos e sacassem as bandeiras de todos os cacifos onde as guardam religiosamente (ou talvez não, talvez tenham dado um salto ali a Mouzinho da Silveira ao cimo da Rua de S.João e compraram a do seu país com o orgulho estampado no rosto…é bom sonhar, não é?), íamos conversando nas bancadas, a única coisa que podíamos fazer até a festa per se começar. Não me interessam minimamente as performances dos miúdos que aparecem no relvado para brilhar com os pom-poms todos em riste e os vestidos fúcsia brilhantes nas luzes do estádio…todos esses deprimentes sucedâneos que têm tanto de futebol como eu de artista plástico. Fiquei até ao fim para prestar a minha homenagem a jogadores e treinadores, aos que me fazem deslocar ao estádio para os ver, que me põem rouco com gritos de incentivo e que de facto fazem de mim portista.

Estava em boa companhia, devo dizer. Amigos portistas de longa data, tinha na minha presença o meu passado e presente de vida azul-e-branca. O puto que comigo foi puto e que também comigo ia até às Antas no início dos mil-nove-e-noventas para criticar Ivic e aplaudir Robson estava lá comigo, numa reunião que teve tanto de nostálgica como de natural. O meu amigo “do costume”, companheiro de tantas andanças da bola, colega de chuvadas mil e o primeiro abraço depois do golo azul-e-branco. E junto a estes dois de sempre mais um, o meu companheiro em Dublin que este ano finalmente se decidiu a comprar o lugar anual e lá está sempre perto para a conversa do costume. Boa gente a marcar bons momentos. E maus, quando aparecem.

Falávamos da festa, da diferença desta festa para as antigas. Naquele tempo em que os jogos que terminavam a temporada eram vividos como uma festa do povo e o povo era outro. Há palcos pré-fabricados com publicidade no tampo; stewards na altura só se fossem bombeiros ou polícias e nada de cordas a separar o público dos seus heróis. Havia poucas danças, pouco fogo-de-artifício, nenhum efeito cénico e artístico. E a nostalgia lá mostrou a cara de novo e recordávamos como o campo parecia inclinado durante os últimos cinco minutos, a pender para o lado do túnel como um verdejante prado numa encosta solarenga…com um túnel perto de uma das suas laterais. Os atletas, fortes, autoritários, vedetas, encolhiam-se para perto da trajectória mais curta para uma rápida fuga para o balneário, para longe dos adeptos loucos que cedo correriam pela relva onde minutos antes tinham visto os ídolos a desempenhar a função que pagavam para ver. Uns lá conseguiam a recordação na forma de uma camisola, uma chuteira ou um par de meias. Ou só uma, qualquer coisa servia para levar para casa e mostrar à família. Era ver jogadores de cuecas, balizas partidas, redes desfeitas, jovens com pedaços de relva nas mãos e placards publicitários calcados. Era uma festa orgiástica de simbiose de mentes e almas, de união entre adeptos e jogadores com a luxúria da proximidade ao êxito a extravasar por todos os poros. Era belo, era humano, era vida.

Hoje em dia o espectáculo é bonito mas estéril. Grandioso mas frio. Produzido mas distante. É um enorme circo feito para shares de facebook e malta que aparece uma vez por ano para bater palmas e que não faz ideia quem joga nas outras vinte-e-nove (ou serão 33?) jornadas.

Tive a sorte de poder viver as duas situações. E quem como eu também o fez, aposto que gostava mais da maneira antiga.

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