Uma experiência ou apenas mais um jogo?

A meio do jogo contra o Arouca, enquanto conversava com alguns colegas de Porta, dei comigo a pensar que tinha percebido as intenções de Luís Castro ao alinhar com aquele onze no relvado do Dragão. Havia um ou outro sinal que me inclinava nessa direcção, mas optei por deixar de fora as conjecturas e tentar perceber o que realmente se passava. E comecei a entender que se tratava de um teste, uma prova de fogo para quem estava em campo por forma a que o treinador conseguisse perceber com quem pode ou não contar até ao final do campeonato e nos próximos jogos que têm tanto de exigente como de difícil. E fê-lo, estou convencido, da forma mais natural possível: usando as suas ideias, o seu esquema táctico, que na equipa B tem trazido bons resultados e que é uma imagem tradicional, em 4-3-3 desde os tempos de António Oliveira, com maiores ou menores nuances tácticas introduzidas por Mourinho ou Vitor Pereira, eles que foram talvez os maiores “trabalhadores” tácticos das equipas que treinaram no FC Porto (excluindo o annus demens de Adriaanse com o seu 3-3-4) e que o povo se habituou a ver. E na minha cabeça, Luís Castro estava a tentar perceber, às apalpadelas, quais seriam os jogadores que se adaptariam melhor ao tipo de jogo que quer ver implementado, pelo menos até ao final da temporada. Pareceu-me também que havia ali uma prova de desempenho, um trial, uma experiência em que a própria SAD começaria a tomar decisões para saber quem deveria ficar e quem é supérfluo aos trabalhos da próxima temporada, numa espécie de preparação antecipada do que será, estou certo, uma quantidade inusitada de vendas quando chegarmos ali a Junho (talvez depois do Mundial, quem sabe?).

Mais alguém ficou com essa ideia ou foi só parvoíce minha?

 

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Baías e Baronis – FC Porto 4 vs 1 Arouca

Ninguém esperaria uma exibição fabulosa, um hino ao futebol ou uma total recuperação psico-motora do que tem vindo a ser o FC Porto versão Paulo Fonseca. A vitória é justíssima mas diria que os quatro golos podem ser exagerados pela qualidade do futebol que mostrámos desde o golo do Arouca até ao petardo do Quaresma, porque se excluirmos a inteligência e talento de Quintero, as boas corridas de Danilo e a capacidade de esforço de Defour, vi muita parvoíce, muito medo da bola e mais uma vez tremendas desconcentrações defensivas que me fazem temer pelo jogo de quinta-feira contra o Nápoles. Como dizia o Dragão Crónico enquanto saíamos do Dragão: “Saímos daqui depois de ganhar quatro a um…e não ficamos satisfeitos.” Nunca estamos satisfeitos, meu caro, e ainda bem. Vamos a notas:

(+) Defour. Merecia ter marcado um golo este louco deste belga que esteve hoje numa forma soberba, cheio de vontade de levar a equipa para a frente e de aproveitar a oportunidade que lhe foi dada. Dá uma vivacidade completamente diferente ao meio-campo quando comparado com Herrera e a forma prática com que recebe bem a bola e a endossa (normalmente) com critério na direcção do colega em melhor posição para a receber. Funciona muito bem como médio volante e continuo a preferir vê-lo nesta posição, que depende em grande parte dos seus colegas do meio-campo, porque um Fernando atrás de si dá-lhe a calma suficiente para fornecer mais bolas para os flancos ou para o médio mais criativo. Acho que teria muito a ganhar com um jogador como Quintero a titular e creio que se poderiam complementar muito bem sem haver sobreposição de movimentos, algo que acontece muitas vezes com Carlos Eduardo (mais 8 que 10). Quero vê-lo a titular em Alvalade.

(+) Quintero. Um dos meus colegas de Porta perguntava incessantemente: “Mas expliquem-me porque é que este gajo não joga?!”. E dou-lhe razão, especialmente se estiver com o sentido prático e inteligente que mostrou hoje. Revolucionou completamente o jogo e mostrou em meia-dúzia de segundos o que Carlos Eduardo falhou redondamente em quase todo o tempo que esteve em campo, com passes finos e medidos na perfeição, a jogar como um 10 puro, recuando apenas para se recolocar e para avançar pelo melhor caminho. Esteve brilhante a espaços e claramente acima da média no resto do tempo, só resta saber se conseguirá manter este ritmo quando (não “se”, mas “quando”) for chamado à titularidade.

(+) O jogo simples dos primeiros trinta minutos. Uma metáfora do majestoso reino dos computadores serve para este tópico. Sabem aquelas alturas em que um computador se começa a arrastar, seja por falta de espaço em disco ou porque se começaram a instalar tudo que é programinhas e programecos, que fazem tudo desde renomear ficheiros com gestos da córnea até rastrear o fluxo de tráfego na auto-estrada mais central de Kuala Lumpur? Nessa altura, o que é preciso na grande maioria das vezes, é apagar tudo e reinstalar o sistema. Foi o que Luís Castro fez, regressando a um meio-campo com um trinco, um volante e um criativo (à imagem do que implementou no FC Porto B), usando o lateral subido para dar apoio ao centro quando necessário, procurando também o overlap com os extremos de uma forma prática e sem inventar. Acima de tudo…sem inventar. E funcionou, pelo menos durante os primeiros trinta minutos, altura em que o FC Porto jogou simples, sem embelezar as jogadas, prático na rotação da bola, com Fernando a servir como primeiro organizador de jogo, Defour a correr para abrir espaços e conduzir a bola, Varela a trocar bem com Danilo e Jackson na área para receber. Depois do golo do Arouca nada voltou a ser como dantes, pelo menos até Quintero entrar…mas aí o jogo estava bem diferente.

(-) A dupla de centrais. Em todos os anos que vejo futebol, não me lembro de ver uma dupla de centrais tão nervosa, tão propensa a erros e tão completamente descoordenada como esta que hoje jogou. Podia ir buscar emparelhamentos antigos, imaginando Lula e Díaz nos tempos de Oliveira ou Ricardo Silva e João Manuel Pinto com Fernando Santos, talvez até Stepanov e João Paulo com Jesualdo. Mas quaisquer umas dessas duplas empalideceriam ao ver a quantidade de idiotices que Maicon e Abdoulaye hoje cometeram (não fizeram, cometeram, para soar mais criminoso) num jogo contra uma das equipas mais fracas da Liga. Passes falhados em dose industrial e uma tremenda incapacidade de jogarem com um mínimo de calma e concentração necessárias, exagerando nos lances de controlo de bola em zona recuada e com a inevitabilidade das desgraças, a começar a pontapear o esférico como loucos quando o cagaço se começou a instalar nas suas cabeçorras depois de várias ocasiões em que falharam e quase permitiram o empate ao Arouca. E se Abdoulaye já nos habituou a uma dose regular de imbecilidades, esperadas de um homem que creio não vir a ser mais que um “fringe player” na equipa, já o facto de Maicon insistir em deixar que a sua própria insegurança se faça sentir em jogo (especialmente depois das últimas duas épocas em que andou a tentar subir a pulso na estima do povo e procura ser titular absoluto na equipa), faz dele cada vez mais uma opção de risco. Já agora, o Reyes vai ficar eternamente a adaptar-se ao nosso futebol?…

(-) Carlos Eduardo. Jogo muito fraquinho do brasileiro, apesar do bom golo que marcou, com uma execução estupenda em plena área do Arouca. O golo não é tudo, como é evidente, especialmente no jogo de estreia do treinador que já o conhecia e o “trabalhou” na equipa B no início da temporada, e Carlos Eduardo não fez quase nada que melhorasse a sua imagem que está a definhar jogo após jogo perante os adeptos. Má movimentação em campo, pobres decisões no passe e excessivo alheamento nos lances ofensivos da equipa, acaba por ser quase o contrário de Ricardo Quaresma, sempre com vontade de ter a bola, esteja ou não em boas condições para a receber e para conseguir fazer alguma coisa de jeito com ela. Está a “pedir” para perder o lugar para Quintero.


O vírus Fonseca, que parece ter afectado uma grande parte dos jogadores, ainda está por aí e parece complicado virmos a fazer uma recuperação milagrosa em tempo recorde. Houve bons momentos, mas ainda há muito trabalho e a malta que aí vem na quinta-feira não é um Arouca. É um bocadinho melhor.

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Ouve lá ó Mister – Arouca

Estimado Professor,

Em primeiro lugar, permita-me que lhe dê as boas-vindas ao novo lugar que ocupa na hierarquia e que o fez passar de Pedroso para as Antas. É uma mudança interessante de freguesia e de concelho mas acima de tudo é um passo acima no que diz respeito à sua experiência pessoal e apesar do lugar não ser permanente, só lhe pode dar um gozo bestial saber que está aos comandos de um dos clubes mais respeitados e vencedores do Mundo. Por isso, mais uma vez, bem vindo.

Tenho acompanhado com interesse o seu trabalho no FC Porto B desde o início da temporada e vi que está a fazer um trabalho estupendo, levando um grupo de miúdos (aditivado aqui e ali com umas peças interessantes de maturidade e experiência) ao topo da divisão em que estão inseridos e que o mérito é em grande parte seu. Tem sabido gerir talento, fez melhorar diversas peças-chave da equipa e construiu uma formação que mostra organização, querer e vontade de vencer em todos os jogos. E foi por isso com alguma surpresa que não vi pelo menos um nome da segunda formação para injectar algum sangue novo no grupo tão desmoralizado que agora gere. Mas não leve isto como uma crítica, porque quem os conhece melhor é o meu caro amigo, por isso deixo ao seu critério pelo menos por agora, mas daqui a algum tempo vai-me permitir alguns comentários construtivos para que saiba o que penso sobre o assunto.

Hoje não espero um jogo fenomenal ou uma exibição daquelas que apetece que o jogo dure cinco horas. Quero que vença, claro, mas quero acima de tudo que reabilite táctica e emocionalmente aquele grupo de retalhos que constitui a equipa do FC Porto 2013/2014. Lá estarei na bancada a apoiar, como de costume.

Sou quem sabes,
Jorge

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Crónica de uma saída anunciada

Recebi a notícia enquanto almoçava. Fiquei surpreendido, admito, até porque a esta altura da época não pensava que houvesse qualquer alteração no leme, por muito complicada que a situação estivesse, e está. Mas fui inundado por uma sensação de alívio que decerto não durará muito tempo, essa tradicional descarga de adrenalina negativa como tivesse acabado de desistir da subida a uma montanha íngreme enquanto a meio da ascensão, enquanto via os colegas mais à frente, quase a perder de vista. Era esse cume a que apontávamos, que agora ainda está ao alcance mas quase impossível de tocar com mãos virgens, e que vemos ao longe enquanto paramos para lamber as feridas, os rasgões que fomos sofrendo ao longo do percurso pelo matagal rasteiro mas cheio de cardos e cactos e espigões que nos foram fazendo sangrar ao longo de nove meses. Não estamos bem, estamos tristes, vamos sofrendo e queixando enquanto levantamos as mãos para o céu e perguntamos se ainda demora muito para acabar. E sabemos que há arbustos com bagas rejuvenescedoras pelo caminho, vermelhas com o sumo da fonte de um qualquer Ponce de León que nos faça erguer com a força e vitalidade de trezentos espartanos e que nos dê a hipótese de continuar a subir. Sempre a subir. Mas paremos com as metáforas e a hiper-deambulação poética para voltar ao assunto mais palpável e fácil de analisar.

Paulo Fonseca sai por culpa própria. Não duvido disso e estou para lá de ser um desculpadista das opções da SAD, das piadas de Pinto da Costa ou das falhas dos árbitros. A culpa de Fonseca é nítida em três vertentes: resultados, opções tácticas e liderança.

Os resultados são a parte fria da questão. É inegável que um treinador chega ao FC Porto com a perene necessidade de vencer. Não há volta a dar a esta exigência, a este zénite doméstico que é quase impossível de manter e que só os grandes alguma vez conseguem com assertividade e consistência. E ninguém lhe pedia para ser um Mourinho ou um Villas-Boas, mas pedia-se que não fizesse, no mínimo, pior que o seu antecessor. E não o conseguiu, espalhando-se ao comprido no campeonato, saindo da Liga dos Campeões com estrondo e mantendo-se amarrado com um fio à Europa League. Venceu a Supertaça, sim, com um jogo até bem razoável, mas foi numa fase tão incipiente da temporada que já ninguém se lembra, nem sequer dá grande importância. E o resto dos meses foi passando com vitórias quase sempre difíceis e demasiadas perdas de pontos. A derrota na Luz foi tão simples para os da casa que nem parecia natural a disputa de um jogo que não é suposto correr-nos bem mas que tantas vezes nos últimos anos tinha sorrido para os nossos lados. E o desaire no Dragão, anos depois do último, foi tão inusitado como esperado por quase todos e lamento dizê-lo, até pelo próprio treinador.

A parte táctica acaba por ser mais questionável tendo em conta o que é a hubris habitual de um treinador de futebol. Ninguém quer simplesmente pegar no trabalho que já estava feito, embrulhá-lo num papelinho todo catita e dizer que o conteúdo é todo novo, esperando que o mérito seja entregue por inteiro. Há uma contínua necessidade de afirmação, de deixar uma marca para o futuro e de dizer que “aquela” equipa é minha, “aquela” estratégia foi criada, inventada e aplicada por mim, pelo que agora está cá e o passado que se lixe. Não o questiono e é uma das formas que um novo nome tem de se fazer ouvir, especialmente quando houve uma ou outra alteração nos elementos que o rodeiam diariamente. Mas chega a uma altura em que os observadores mais atentos do resultado do seu trabalho (não do trabalho em si, atente-se), os adeptos, perdem a paciência. E este ano foi fácil perceber que algo não estava a funcionar. A insistência nos dois homens mais recuados no meio campo pareceu sempre estranha a um grupo que nunca o tinha feito e em especial a um ou outro jogador que pareciam desconfortáveis em demasia com o que lhes era pedido. Havia buracos enormes no centro do terreno, falta de apoio nas alas, um tremendo abismo entre o centro do ataque e o resto das posições ofensivas…tudo parecia estar a funcionar mal, sem entrosamento e com demasiadas hesitações na altura de colocar em campo o que todos já vimos que aqueles rapazes podem e sabem fazer. Fonseca foi-se perdendo em hesitações nas alas, mudando constantemente a estrutura sem deixar de privilegiar a sua visão, nunca querendo perder a estratégia geral e desperdiçando tempo e oportunidades em alterações que eram nucleares, não o parecendo.

E quando as coisas não funcionam, chega a altura da terceira falha, talvez a mais grave: a liderança. Nunca o treinador pareceu forte, nem no discurso e muito menos durante o jogo, onde os aplausos sempre pareceram exagerados e sem efeito na moral dos jogadores. Falhas após inconcebíveis falhas defensivas eram saudadas com uma ronda de incentivo em forma de meia-dúzia de palmas vindas do banco, de onde pouco mais parecia sair a não ser a compreensão pelo trabalho mal feito e a crença cega que iria melhorar no futuro. Dava a impressão que o treinador era pouco pai, pouco chefe, pouco disciplinador e muito amigo, muito compreensivo, muito new-age. Quando a espiral negativa dos resultados começou então a abanar a estrutura, não havia pulso. As falhas sucediam-se e a ausência de uma palavra forte para fora que ecoasse para dentro foi-se notando, ajudando a desfazer as fundações de uma equipa que é feita de massa fraca, com muitos jogadores a cederem psicologicamente às suas próprias ineficiências sem que conseguissem elevar a moral durante mais de cinco minutos de cada vez. E foi aí que Fonseca começou a perder o grupo, perdendo os adeptos por arrasto.

Perdemos, por isso, um treinador que foi uma aposta no início da temporada e que nunca chegou a conquistar seja quem fosse dentro do FC Porto. Há várias atenuantes (as perdas de Moutinho e James; a falta de um jogador decisivo nas alas que Quaresma, pelas características que tem, nunca será em pleno; o constante assédio a jogadores do núcleo central durante o mercado de Inverno) mas nenhuma delas pode explicar a quase completa implosão que o FC Porto atravessa neste ano. Exigia-se mais e melhor. Fonseca nunca conseguiu o mínimo e por isso sai, com consciência de um trabalho feito com honestidade mas sem capacidade para um clube deste nível.

Obrigado, Paulo. Que tenhas sorte no futuro, mas deixo-te um conselho: não tentes ser amigo dos jogadores a não ser que te retribuam em campo. Porque quer queiras quer não, antes de seres amigo deles, tens de ser chefe.


PS: Um bom exemplo da forma como a comunicação do FC Porto funciona está na notícia que foi colocada no site oficial do clube em relação à saída de Fonseca. Nem um agradecimento pelo trabalho efectuado ou uma palavra simpática. Estamos a passar de clube regional para clube grande, sem a mentalidade de gente superior. Entristece-me.

PS2: Interino ou não, Luís Castro é o nosso novo treinador. E eu, que ando desde o início do ano a ver os jogos da B e a apreciar o trabalho do “mister” (e há meses que ando para escrever sobre os valores que vão aparecendo na equipa secundária…o que prova que o timing é tudo e que eu, sinceramente, sou uma bestinha), não espero nada de extraordinário nos próximos tempos. até porque já tenho idade suficiente para não acreditar em milagres. Seja como for, bem vindo, caríssimo!

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