Amaldiçoo as palavras que proferi antes do início do jogo, enquanto o céu abria todas as torneiras que tinha, descarregando água com a força de onze deuses e a intensidade de outros onze. Nessa altura, protestava eu com o árbitro que avaliava as condições do pobre relvado e reclamava pela pouca celeridade da drenagem e das decisões dos fulanos de negro. E agora, penso que mais valia o jogo ter sido adiado. Talvez o passe de Tello tivesse chegado a Brahimi. Talvez Maicon não tivesse sido imprudente. Talvez os remates de Herrera tivessem chegado à baliza. Talvez Mika não tivesse agarrado as cabeçadas do Jackson. E talvez não estivesse agora com um mal-estar tremendo e cara de chateado. Talvez. Vamos a notas:
(+) Marcano. Bom jogo na estreia absoluta. Excelente a jogar pelo ar, de toque fino e prático, a colocar sempre a bola no chão antes de a passar para um colega. Apesar de raramente ter sido obrigado a desempenhar as tarefas inerentes à posição que ocupa, esteve perfeito nalguns cortes pelo relvado e quando Lopetegui o colocou quase no centro do esquema de três defesas (Casemiro foi mais volante que central) esteve seguro e sem tremideiras. Em Alvalade veremos se vale alguma coisa a defender contra uma equipa a sério.
(+) Danilo e José Angel. Tentaram tudo para que a equipa conseguisse criar situações de perigo na área e fizeram os dois flancos dezenas de vezes durante todo o jogo. O espanhol recebeu mais apoio que o brasileiro e pareceu sempre com vontade de colocar a bola na área mas fê-lo com critério e sem abandalhar nos cruzamentos excessivos. Falta-lhe a capacidade de furar como Alex Sandro mas parece ser uma boa alternativa, nivelando um pouco por baixo. Danilo começou mal o jogo, com muitas cruzamentos e passes falhados, mas foi subindo de produção e nunca desistiu. É essa uma das grandes mudanças em Danilo nesta época: a mental. Espero que assim continue.
(-) A expulsão de Maicon. Imagino que vai haver duzentas opiniões acerca do lance e mais de metade vai achar que não era motivo para expulsão. Porque era a meio-campo, porque a entrada foi 12 graus desviada na vertical do que se pode considerar “por trás”, porque foi a primeira falta, entre outras. Mas é na verdade muito simples de analisar o lance. Duas simples premissas: a entrada é dura, de pé levantado e acerta no jogador por trás (de lado, como quiserem). Maicon foi imprudente e colocou-se à mercê do árbitro, só isso. Já vi dezenas de lances iguais que não mereceram cartão, nem amarelo nem vermelho. E já vi outras tantas dezenas que acabaram com o faltoso a ser expulso. Calhou-nos a segunda. E, caros portistas, pensem no seguinte: se fosse de outra cor, o que diriam do árbitro se não expulsasse o rapaz?
(-) A condição física da equipa Estamos na 5ª jornada e já vejo vários rapazes do meio-campo para a frente a vomitarem-se todos para acabar um jogo. Sim, jogámos muito tempo com dez jogadores. Certo, estivemos quase sempre com a bola nos pés, o que cansa mais. Compreendo, Ruben Neves tem 17 anos, Herrera e Brahimi estiveram no Mundial. Mas não é bom sinal quando chegamos a meio da segunda parte e os dois jogadores mais importantes na construção ofensiva da equipa estão agarrados às pernas e o desequilibrador principal da equipa não aguenta mais que duas ou três corridas. Começo a pensar que a rotação imposta por Lopetegui se deve mais a factores físicos que tácticos…
(-) Tello. Trapalhão, incapaz de adiantar a bola uma distância aceitável e decente para a conseguir continuar a controlar em drible. Nada lhe correu bem, desde a assistência de morte para Brahimi que ficou na piscina, aos cruzamentos falhados e aos 1×1 inconsequentes. Muito fraco para alguém que sabe muito mais que isto e apesar de ser um homem de irreverência e velocidade, tem também de perceber que tem de fazer alguma coisa de jeito depois de acelerar ao largo do adversário. Hoje, não fez nem uma nem outra.
(-) As opções de Lopetegui. Ao intervalo íamos discutindo o que poderia ser feito para mudar o jogo. A jogar com menos um homem, as opções não eram muitas e cada uma era mais radical que a anterior. A ideia dos três defesas não seria impossível de funcionar, mas o consenso entre os colegas de bancada estava na mudança do tipo de jogo para um approach mais directo, mais incisivo, alheando um pouco da posse e atacando mais agressivamente a baliza adversária que até então pouco tinha sido alvejada. Sai Tello, entra Aboubakar (ou Adrián), passa Brahimi para o meio a ver se saca um livre ou um espaço entre os defesas, mandam-se subir os laterais e siga. Não seria fácil, com o meio-campo tão pouco elástico, lento demais para cobrir as subidas dos colegas pelas alas, mas era um risco que se aceitava. Tomadas as decisões, olhámos para o campo…e o jogo continuou como estava. Ninguém nega que podíamos perfeitamente ter marcado dois ou três golos durante os noventa minutos. Tivemos oportunidades, muita desinspiração e alguma incapacidade de rematar de longe em condições. Mas Lopetegui merece a minha crítica porque não mudou. Porque parece estar fixo na fidelidade a um modelo táctico que privilegia apenas a forma que ele vê como certa. Repare-se na entrada de Adrián. Colou-se o espanhol à linha esquerda, enquanto que Ruben definhava no meio-campo e Jackson continuava abandonado como um filho bastado à porta de um convento, esperando que um fugaz cruzamento de Quaresma ou uma jogada de Brahimi conseguissem criar algo que até então não tinham conseguido. Lopetegui mostrou a todos que é este o caminho que vai seguir. E se houver obstáculos nesse mesmo caminho, não está disposto a mudar muito para os contornar. Os teimosos são assim.
E lá vão quatro pontos. Quatro pontos desperdiçados numa fase tão incipiente da temporada, que nunca mais serão recuperados e que tanta falta nos podem fazer mais lá para a frente. Na sexta-feira, não podemos perder mais pontos.
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