Ouve lá ó Mister – Estoril

Señor Lopetegui,

Já passou a euforia do jogo em Bilbau e voltamos a lusas terras para continuar a progressão nesta prova menor que já conheces como Campeonato ou Liga ou “aquela coisa que se joga todas as semanas”. Sabes, aquele em que não estamos em primeiros. Ainda.

Quis o destino que me fosse oferecida a oportunidade de passar um fim-de-semana com malta que tenho muito próxima do coração mas infelizmente demasiado longe da porta de casa. E como tal, algo quase inacreditável vai acontecer, que temo possa prejudicar intensamente a preparação da equipa e quiçá o próprio jogo: vai ser a segunda partida consecutiva que terei de ver em diferido. Lá calha, não se pode ter tudo a não ser que se seja o Jackson, que marca golos e até lhe dão a hipótese de fazer o mesmo de penalty, mas o rapaz não quer nada com aquilo. Já pensaste, sei lá, em escolher outro fulano para chutar a bola lá para dentro? Assim tipo lá para dentro mesmo? Homem, escolhe qualquer um. Qualquer um. O Fabiano, por exemplo, não pode fazer pior serviço que o Jackson, por isso da próxima vez que o Danilo apanhar uma patada de um adversário ou o Brahimi for empurrado (tudo dentro da área, claro), manda o sr. Freitas lá para a frente e põe-no a biqueirar o couro para a rede. Se o Fabiano não quiser, põe lá o Alex Sandro, pode ser que saia do poço em que parece que se meteu. Ou o Tello! Não, pensando melhor, o Tello não. É capaz de tentar adiantar a bola antes de marcar e lixa-se mais uma chance das boas.

Seja como for e seja quem for que escolhas para ir lá para dentro hoje à noite, vê lá se matas a vontade dos amarelos cedo e a boas horas. Não deves reconhecer o rapaz que eles têm lá na frente, mas ele já foi titular do FC Porto aqui há uns anos. E também há lá outros conhecidos nossos, na baliza, na lateral esquerda, numa das alas e na ponta superior do meio-campo. Malta boa, não duvido, mas ainda assim tenta impedir que qualquer um desses mostre mais serviço do que deve. Respeito! E três pontos, faz favor.

Sou quem sabes,
Jorge

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Baías e Baronis – Athletic Bilbao 0 vs 2 FC Porto

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foto retirada do facebook oficial do FC Porto

A melhor exibição do FC Porto de Lopetegui, sem qualquer comparação com os 5-0 em Arouca ou os 6-0 em casa ao BATE. Excelente na cobertura dos espaços, muito bem na recuperação, toda a equipa esteve com força, com capacidade de entre-ajuda e acima de tudo com mentalidade de jogo grande contra uma equipa que não terá sido o melhor Athletic de sempre mas não deixa de ser um adversário que dá água pela barba a qualquer um. Vencemos com total mérito e passámos aos oitavos com a satisfação de dever cumprido e a noção que a equipa parece estar a começar a encontrar a melhor forma de jogar. Juntos. Vamos a notas:

(+) Brahimi. Ainda vai ser processado pela União Geral de Meniscos Rasgados, porque deve ser o inimigo público número um de todos os defesas que o vêem a passar, sem sequer perceber como raio é que se consegue rodar sobre si próprio com tanta velocidade num campo tão enlameado. Estupendo no primeiro golo, a deixar cinco jogadores do Athletic para trás, inteligente no segundo golo ao subir para pressionar o keeper basco quando o colega lhe decidiu mandar a bola aos pinchinhos. É bom, mostra que é bom e só pode continuar a ser bom. E é nosso.

(+) Jackson. Trabalhou como um mouro no exército de Saladino quando a Cristandade atirava com tudo o que tinha contra os portões de Jerusalém. Para lá da quantidade de vezes que veio atrás ajudar a defesa com cortes de carrinho e recuperações de bola no nosso meio-campo, foi nos outros cinquenta metros que mais brilhou. Recebia a bola na frente, no meio dos centrais, recolhia-a no seio do seu perfeito domínio de bola e do espaço circundante e endossava para o colega. Fez isto trilhentas vezes durante o jogo e continua a impressionar a forma aparentemente fácil como consegue controlar a bola mantendo-se tão longe dela. Aquele toque com a ponta da bota é já uma imagem de marca e não fosse A MERDA DO PENALTY e tinha tido uma nota ainda mais positiva. Um Baía com outro Baía às cavalitas, pronto.

(+) Finalmente um meio-campo! Não sei o que é que Lopetegui lhes disse antes do início do jogo, ou se fumaram todos umas coisinhas estranhas que se compram na rua e decidiram em conjunto mostrar que sabem jogar à bola como um colectivo que se entende bem e consegue trocar a bola como homens. Casemiro e Óliver fizeram o melhor jogo com a nossa camisola e Herrera não esteve ao nível dos dois colegas por muito pouco. O brasileiro esteve perfeito na intercepção e no posicionamento defensivo (a sério!), prático no corte, bem colocado para anular montanhas de ataques contrários, fazendo-o com simplicidade e eficácia. Óliver (ou Torres, segundo LFL) não parou todo o jogo, movimentando-se quer no meio-campo a procurar linhas de passe, retendo a posse de bola quando a recebia e pressionando os centrais adversários quando subia para o lado de Jackson. E o nosso mexicano, o anti-herói preferido, esteve bem no passe, a progredir firme no terreno e a soltar a bola para os flancos quando o jogo pedia passes horizontais bem medidos. Foi o que fez. Todos estiveram muito bem, só peço que continuem. Por favor, continuem.

(-) Alex Sandro. Foi o Alex do costume, lento a executar, complicado na decisão, excessivo na posse de bola e na incapacidade de proteger o flanco de uma forma consistente, mesmo com pouca ajuda à sua frente. Subiu de produção na segunda parte, onde esteve mais estável e firme no apoio ao ataque e a sacar faltas aos incrédulos avançados do Athletic, incapazes de perceber como é que um brincalhão daqueles é titular numa das melhores equipas do Mundo. É, meus amigos, sabem que ele nem sempre joga assim…e um dia que volte a fazer o que sabe, pode ser que saia aqui dos Baronis.

(-) O penalty falhado. I…don’t even…*suspiro*

(-) O relvado. Para mandar abaixo a ideia que os clubes de primeiro mundo são superiores aos outros em tudo…fica o exemplo do lamaçal do San Mamés. A fazer lembrar um qualquer ervado dos distritais, onde os jogadores patinavam como que estivessem em cima de um lago gelado ou numa planície de neve sem raquetes nos pés. E mesmo assim, o Brahimi desfez os joelhos aos moços todos. Bem feito.


Oitavos da Champions. Sabe bem, carago, já tinha saudades. Hoje vou dormir descansado. Obrigado, rapazes!

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Ouve lá ó Mister – Athletic Bilbao

Señor Lopetegui,

Aqui há duas semanas foi engraçado jogar contra estes fulanos. Tinha medo do Athletic do ano passado, mas para te ser sincero estes rapazes só me assustaram porque os “nossos” rapazes parecem fazer de tudo para que nunca consiga ter uma noite descansada. Mas também vamos lá ver uma coisa: jogos de Champions não são para descansos nem para relaxar nem para acalmar as pilinhas conjuntas. O que interessa nestes jogos é que estamos a enfrentar a créme de la créme da nata europeia, o folhadíssimo croissant, a fresquíssima bavaroise, a delicada pavlova que é um confronto entre nações através dos seus clubes. Metáfora docinha, é o que é.

Hoje o jogo não vai ser fácil mas não é impossível. O ambiente é complicado mas não é insuportável. Os bascos até são gajos porreiros, gostam é muito do clube deles e raramente o assobiam. E a vantagem é que vocês hoje vão ouvir imensas assobiadelas vindas das bancadas, novamente dirigidas a vocês! Sim, tu e os teus moços vão ser vaiados, enxovalhados, vão sofrer com enciclopédias de insulto fácil em basco e espanhol e na linguagem universal dos dedos estendidos para a frente, reconhecível desde os Maori aos Inuit. E manda-os lá para dentro com a vontade de um Guarín em Sevilha, de um Derlei na Corunha ou de um Hulk em Madrid! E não te peço que ganhes o jogo, porque sei que não vai ser fácil. Porra, Reais e Barças perdem aí pontos com a consistência de um metro japonês, por isso não me incomoda se não vencermos a partida. Mas não quero perder. Nenhum de nós quer perder e arriscar hipotecar uma qualificação que tem tanto de fácil como de dependente da nossa vontade.

Por isso manda os rapazes lá para dentro sem medos. Sem medo nenhum do público, dos adversários ou do que lhes pode acontecer se gritarem: “O País Basco é uma bela duma snaita, é sim senhor!” quando forem cumprimentar o capitão adversário. Já agora, tu eras o primeiro a dar-lhe um tabefe, não eras? Eras. Acho que eras.

Sou quem sabes,
Jorge

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No olhar de um adepto

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No olhar de um adepto, todas as jogadas contam. Há um restinho de quase-nada que se ergue do fundo da nossa alma e começa a puxar pela nossa voz, pelas fibras de todo o nosso ser futebolístico, que nos faz abrir os olhos e focar no homem que tem a bola e que começa uma qualquer incipiente jogada a partir da sua defesa ou no meio-campo. A bola, quer esteja sob o seu controlo ou fora do seu alcance, torna-se o ponto focal de toda a visualização do jogo, toda a esquadria que se vai desenvolvendo como se uma grid de Terminator caísse sobre os nossos olhos, transformando-os em miras telescópicas enquanto procuramos entender a melhor forma de levar o esférico para a frente. Para a vitória, para a baliza, para o idílio.

Maicon recebe a bola de Fabiano. Progride com calma. Calma demais, penso da cadeira do Dragão que me aloja e me permite olhar para o central com a autoridade de quem se acha superior e gere essa arrogância de uma forma tranquila até ao ponto da explosão em milhares de pedaços que rebentam com o nervosismo de quem, no fundo, é impotente para parar o que se desenrola em campo. Mas voltemos ao calvo brasileiro. Maicon recebe a pelota e olha para a frente. O raciocínio é difícil e ao mesmo tempo tão natural, tão habitual que o recurso à memória dos treinos e da esquematização da táctica, que deveria entrar em primeiro lugar na fila, senta-se no fundo da plateia à espera que a infrutífera revisão das recordações o activem. Passe lateral, para Danilo? Está livre, é possível, já o fiz no passado tantas vezes, o risco é quase nulo, ele recebe e se não conseguir subir com a bola pode devolver-ma ou entregar ao trinco. Not bad. E se eu rodar e enfiar a bola pelo meio para o Casemiro? Ou para o Herrera? Há mais risco, mais pernas, mais relva a trilhar, mais oportunidade de me assobiarem se falhar. Ao mesmo tempo ganho terreno, crio desequilíbrios, abano os adversários, faço-os tremer. Hmm. Ponder, ponder. O Indi está ao meu lado mas ainda são vinte metros e o outro parvo está ali perto. E se falho o passe? E se tropeço? E se a bola pára de rodar, se as leis da Física se suspendem durante dois segundos e a bola trava sozinha? Não, para ali não, hoje não, agora não. E se mandar a bola para longe? Para muito longe? Para o Tello, aquele pontinho azul-e-branco que está ali a quarenta metros? Cinquenta! Não, setenta! Mil! Está a sete quilómetros de distância e talvez seja a melhor forma de me safar disto. Já aí vem o avançado, raios te partam que tu és rápido, não parecias nada, como é que chegaste aqui tão depressa, maldito. É isso mesmo, vou mandar a bola para longe, assim não me chateiam, não me insultam. Haverá mais destas, muitas mais. Esta é só uma que já passou. Cá vai.

E normalmente a bola perde-se pela linha. Por culpa dele. Por nossa culpa. Por culpa dos demónios na cabeça. Podia ser qualquer outro jogador, o processo seria o mesmo.

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