Há onze anos


2004 (May 4) Deportivo La Coruna (Spain) 0… por sp1873

Tinha acabado de sair do cortejo da Queima das Fitas, o último em que participei com a actividade que me era permitida no estado em que me fui progressivamente encontrando, reminiscente de tantos outros cortejos com os mesmos ou outros colegas. O álcool flui livremente nestas ocasiões e é impossível de manter o controlo a partir de uma certa altura, porque a vontade de celebrar sobrepõe-se à inteligência e a emoção supera a razão a todos os minutos. Cerveja, litros dela, morna ou fresca, não interessa, porque o corpo vai acomodando os decilitros sorvidos pelo orifício de uma lata mal lavada e enfiada numa bacia de gelo que ninguém ousa questionar quanto à origem. Quanto é, menina? Um euro? Força, dê-me sete! Sei lá, fique com o troco! E distribui-se aquele pedaço de alegria líquida pelos amigos, brinda-se com choque mas sem ruído dos receptáculos, apenas das vozes que se erguem até ao céu e proclamam um qualquer desaforo que une e continua a unir almas e espíritos num uníssono só conseguido após vários anos de partilha das mesmas experiências.

E naquela terça-feira em Maio de 2004, outras vozes se juntavam ao coro. A vontade era grande e os jogadores imensos, aquele grupo de pariás de outras terras que se juntou debaixo do manto unificador de Mourinho na Invicta, que jogou do melhor futebol que vi e que dava segurança, estabilidade e confiança aos adeptos. E este foi um jogo tenso, cheio de pequenas guerrinhas, com o controlo da partida e um fio de não sorrir aos dragões e a bola a teimar a não entrar na baliza de Molina. Era bravo, este Depor, com jogadores acima de muitas médias, infelizmente colocado num nível que não merece por tanta comentariagem da nossa praça, incapazes de aceitar que as meias-finais da Champions se tinham disputado a Norte e agora ainda mais a Norte, dentro da mesma península.

Vi o jogo num ambiente que, agora que penso, não deveria ser memorável. Em pleno NorteShopping, já a caminho daquele spot onde milhares se iam (e vão) para se desfazerem em ainda-mais-álcool, com centenas de portistas colados à televisão e eu, ainda sem conseguir deglutir um grama que fosse de qualquer das dezenas de sanduíches e bifes enlatados que estão ao dispor de todos naquela praça. Bebia, só bebia, mais uma cerveja aqui, mais outra ali, e o jogo que não se desatava. Até que Deco fura pela área e é mandado abaixo. Collina não têm dúvidas, Derlei sobe, pousa a bola na marca, atira para muito longe de Molina que faz um voo rasante quase suficiente para desviar para canto. A bola entra. Eu salto, festejo, vibro. A final era logo ali. E foi. E foi nossa.

E vocês, onde estavam quando o “Ninja” enfiou a bola nas redes do Riazor?

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Baías e Baronis – Setúbal 0 vs 2 FC Porto

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Um lance bonito a começar e outro a acabar. E no meio? Uma enormidade de posse de bola que resultou em quase zero lances de perigo para a baliza do Setúbal, como se a maioria dos rapazes estivesse numa espécie de treino a meio-campo e que chegando perto dos “mecos” do outro lado, que como os “alemães de Bielsa” que Lopetegui já tinha usado no início da época, se limitavam a tentar tapar as nossas investidas sem grande sucesso até à entrada da área. Depois, era escolher o rapaz mais desinspirado e garanto que não seria uma selecção fácil. Enfim, vencemos. Notas já aqui em baixo:

(+) As trocas de bola no centro. Especialmente na primeira parte, a forma como o FC Porto trocou a bola na zona central do relvado foi nada menos que estupenda. Com aparente facilidade na movimentação das peças, a bola seguia em posse até ser entregue a um colega, triangulações quase perfeitas, endossos fáceis e lineares para os flancos e um bem-estar geral que parecia confundir alguém que tivesse visto o jogo da semana passada na Luz. É assim o estilo que Lopetegui quer que o futebol da equipa seja, com passe curto, contenção no envio de canhoadas directas para o ponta-de-lança e facilidade na desmarcação. De salientar Brahimi que apareceu muitas vezes em zona de “10”, o que não me agrada muito mas que hoje acabou por funcionar até ao ponto em que era de facto preciso fazer qualquer coisa. Resultou no golo, nada mau.

(+) Alex Sandro. À imagem do que tinha feito na semana passada na Luz, apareceu em grande em Setúbal, a romper pelo flanco em subidas rápidas, aparecendo sempre no espaço e pecando apenas na entrega da bola para o avançado (não foi o único, ler abaixo…), mas foi um constante fluxo de jogadas potencialmente perigosas. Até apareceu ao segundo poste para tentar cabecear. Seu louco!

(+) Casemiro. Excelente na retenção da bola no meio-campo e o primeiro a fazer com que ela rodasse em boas condições para os colegas, foi também o elemento de força de que precisávamos numa zona em que está cada vez mais adaptado a saber quando ser rijo e quando ser prático. E a maior parte das vezes tem conseguido ser as duas coisas ao mesmo tempo, o que faz dele um elemento fundamental na estratégia da equipa. É por tua causa que o Ruben não joga tanto, Casemiro!!!

(-) A quantidade absurda de passes falhados. À semelhança do jogo da Luz, lances de perigo perto da baliza foram quase nulos e Raeder foi vendo o tempo passar sem precisar de se colocar em campo durante grande parte da partida a não ser meia-dúzia de cruzamentos altos e um ou dois remates ao lado. E todo o jogo que foi criado entre linhas não passou das duas primeiras: a defensiva e a do meio-campo, porque o ataque foi inconsequente com Quaresma, improdutivo com Brahimi e pouco mais que ridículo com Hernâni. Preocupa-me muito ver tanta posse de bola desperdiçada e sermos obrigados a andar até ao final do jogo a pensar se uma parvoíce nos vai roubar os três pontos. Não seria a primeira vez.

(-) Lances de bola parada. Mais um jogo em que diversas oportunidades se perdem entre jogadas pseudo-combinadas, maus cruzamentos e uma infeliz incapacidade de criar perigo em lances que são feitos exactamente para isso. É triste perceber que um canto para o adversário me deixa a tremer como um menino ao passo que o mesmo lance a nosso favor não levanta um mínimo de emoção na minha psique.

(-) A lesão de Marcano. Um lance de trampa pode ter levado a que Marcano falhe o resto da época. Não é justo e devíamos reclamar. A Deus, ao demónio dos ombros deslocados, seja a quem for. E já deu para perceber que a atmosfera não está fácil para espanhóis, porque depois de Óliver e Tello, agora este hermano também se estoura para umas semanas. Raios.


Fizemos o que nos era exigido e continuaremos a fazê-lo, espero. Continuo a acreditar que é possível e lá estarei no fim-de-semana para ver o Gil. A ver se também damos cinco.

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Ouve lá ó Mister – Setúbal

Señor Lopetegui,

Faltam quatro jogos para acabar esta coisa (ou dois, já que o benfas tem um jogo à frente e seis/sete pontos à frente) mas eu continuo a acreditar que é possível. Está lá no fundo, nas raspas do fundo do barril onde só cheira a borra, que estranhamente parece mesmo aquilo a que cheirou aquele jogo na semana passada. Fiquei desiludido contigo, Lope, por várias coisas: pela falta de convicção que os teus rapazes mostraram, pela incapacidade de os motivares para a ganharem e pela parvoíce de te mandares para cima do JJ como um puto amuado. Não é assim que vais ganhar aqueles gajos, Julen, acredita, especialmente a fulanos com a pedalada que ele tem para armar confusão. Já vais em dois rounds perdidos contra ele(s) e este já te deixou perto de um knockout simples. Não deixes que o próximo seja o definitivo.

Para o jogo de hoje, só me surpreende deixares de fora o Fabiano. O puto ainda não recuperou da coça que levou em Munique? Não estou aí dentro do balneário (mas gostava, carago, nos bons e maus momentos, o que eu gostava…) mas se o rapaz está sem condições mentais para continuar a defender a baliza, é preciso pensar bem no que se vai fazer com ele. Se for só uma indisposição temporária, tudo tranquilo, siga pra bingo.

Hoje é só ganhar. Não há outro resultado possível.

Sou quem sabes,
Jorge

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Now. I mean now. Now. Really. Now.

now-clock

Deixei assentar a poeira depois do fim-de-semana para ver como paravam as modas. O post anterior bateu o recorde de comentários aqui do tasco e não sendo nada que mereça uma celebração acima de um auto-high-five, sempre mostra que a malta está disposta a vocalizar o apoio e/ou a crítica nos fóruns por aí espalhados, nos quais me incluo com alguma dose de orgulho. E preocupa-me alguma da prosa que vou lendo.

Há um estranho imediatismo que se foi criando nos adeptos do FC Porto desde há alguns anos e que tenho vindo a acompanhar com um misto de curiosidade e desconfiança. E um bocadinho de nojo nalgumas circunstâncias, mas tento não o mostrar muito. E é uma sensação curiosa esta de ver um núcleo que habitualmente era tão unido e tão focado na busca de um objectivo comum a desagregar-se em guerriúnculas e picardias sobre figuras que noutras épocas, com outros nomes e outros passados, serviam como fonte de proximidade e harmonia.

Tomemos o exemplo do treinador, que se tornou uma entidade de discórdia tão grande que urge parar para pensar na forma como encaramos os lugares de chefia numa qualquer organização e na aparente necessidade de destruir a imagem e a capacidade de trabalho, de desprezar o dia-a-dia que qualquer um de nós dava um rim e dois dedos dos pés para poder partilhar, tudo para o bem de uma causa que parece menos comum a cada hora que passa. As decisões são contestadas com a volúpia de uma self-righteousness (não consigo encontrar um termo em português, perdoem-me o anglicanismo) que tolhe o pensamento. A frieza da análise desaparece perante o monstro devorador da vitória, da necessidade de angariar opiniões conjuntas que criem a ilusão que a massa funciona como um todo, onde a parte não é mais que um rolamento na máquina e está lá, robótica, para fazer o servo-mecanismo da equipa registar os rendimentos esperados. Desaparece o homem, foge a identidade pessoal, insulta-se porque sim e porque parece bem e porque eu bem disse que ia ser assim. Os jogadores são atirados para a fornalha como qualquer outro, mercenários nas derrotas e ilustres nas vitórias, incapazes no sofrimento e valentes no combate. Tornámo-nos na turba que tanto desprezámos durante anos a fio, maralhando aqui e além com o pin bem cravado no peito e a cartolina erguida com uma qualquer deambulação proto-poética que deveria transmitir o que pensamos mas só se ficar bem na televisão ou na visão pública. Esquecemo-nos da qualidade pela quantidade, desaparecemos num mar de diatribes e opiniões formadas com a opinião dos outros e abafamos a forma de ver as coisas pela crítica da forma como os outros as vêem.

Hoje em dia, ser portista tem de ser mais que isto. Tem de ser. Recuso-me a emitir declarações de uma síntese tão autoritária como tenho visto por essa bluegosfera, em que a coerência vale tanto como um saco de cebolas podres e o bater no peito parece tão vazio como a liteira do Schrödinger. E se continuarmos por este caminho … *sobe para um palanque no meio da praça* … vamos a caminho do abismo. Fundo, escuro, de onde não há saída a não ser após muitos e longos anos. Vamos aprender a aprender, vamos perceber os erros e corrigir as falhas, melhorando. Não há clubes perfeitos, não há sociedades utópicas, por muito que More tenha tentado fazer perceber que a hipótese seria real. Ou não.

Sejamos melhores pessoas. Sejamos melhores portistas. Novos ou velhos, não vai haver melhor altura.

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