O percurso é sempre o mesmo

Olho para as sapatilhas enquanto o pensamento voa a velocidades parvas, com sinapses a disparar pelo cérebro fora e penso: está na hora. Não há árbitro? Onde estão as equipas? Está na hora? Já está, cheguei aqui há mais de vinte minutos e já vi o Imbula a mandar uma bola prá bancada e o Alex a cruzar para o fim do mundo e até o Varela parece com vontade. Está bonito, está. Está na hora? Está quase.

Os momentos que antecedem um jogo do FC Porto são habitualmente joviais nestes primeiros jogos da temporada. Conversa-se para aqui enquanto as nádegas se vão reconfortando à cadeira que é nossa durante umas horas de um final de tarde de sábado. Uma hora ou coisa antes, saio do café de camisola no lombo, calorzinho na nuca e sorriso no rosto e começo a navegação automática que me leva ao Dragão. Já houve tempos em que fazia o mesmo percurso a caminho das Antas, anos depois de me fazer homem e de tomar café no mesmo sítio, com a mesma companhia e os mesmos tiques e nervosismos. Andava a passo apressado pelos meandros das ruas em que o estádio se via ao longe, percorria as ladeiras dos campos de treino e atravessava o apertado corredor a caminho da bancada que ficava mesmo por cima do relvado onde os rapazes aqueciam para o jogo que se seguiria. Outrora João Pinto, Semedo ou Capucho, agora Maxi, Imbula ou Brahimi. A nacionalidade muda mas o espírito permanece, sempre com força, sempre com brio.

Vejo muita gente a caminho, iguais a mim, diferentes de mim, altos e baixos, gordos e magros, barbudos e barbeados, sorridentes e sisudos, conversadores e mudos. Vamos todos para lá. Vamos continuar a ir todos para lá.

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Baías e Baronis – FC Porto 3 vs 0 Vitória Guimarães

retirado de desporto.sapo.pt

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Para primeiro jogo, foi bem bom. A equipa pareceu harmonizada, com o estilo mais musculado do meio-campo a contrastar com o “onde está o Casemiro?” do ano passado sempre que era necessário usar o corpo para vencer as bolas divididas. As alas foram ágeis, com os laterais a subirem no terreno sempre que possível, a integração dos novos a correr razoavelmente bem e um rapaz que mostra que pode haver vida depois de Jackson mais cedo do que se pensava. Ainda houve tempo para um Varela trapalhão mas empenhado, um Tello rápido mas inconsequente e um central que sendo o quarto da hierarquia no início do ano passado se afirmar como titular indiscutível. Sic transit gloria mundi e por aí fora. As primeiras notas da época estão já a seguir:

(+) Aboubakar. Humilde, trabalhador e eficaz. Já tinha entrado no goto dos adeptos quando libertou alguns mísseis no ano passado e começou o ano da melhor maneira: com golos. Não é Jackson e nunca o será, mas a diferença entre ele e o colombiano faz-se na força e velocidade com que consegue ultrapassar os adversários e na aparente facilidade com que vem atrás ajudar a equipa na construção ofensiva. Osvaldo, puto, tens de fazer pela vida, que o Vincent entrou em grande.

(+) Maxi. Não sabe jogar de outra forma sem ser na raça, mas surpreendeu-me com a forma como se integrou tão rapidamente na criação de lances ofensivos e na facilidade de desdobramento com qualquer um dos alas que lhe apareceu à frente. Foi o mesmo Maxi que vimos durante os últimos anos de vermelho ao peito: lutador, duro, esforçado, sempre pronto a subir no terreno e a recuar com garra e a conquistar os adeptos pela capacidade de recuperação defensiva e pelo sentido prático. Continua a ser estranho aplaudi-lo, mas está a saber fazer-nos engolir as dúvidas que poderíamos ter quando o contratamos. Que continue assim, é só o que peço.

(+) Varela. Entrou trapalhão, lento e inconsequente, mas fez uma excelente segunda parte e acabou por marcar um golo que fez por merecer. Mantenho que não podemos depender de um jogador como o nosso Silvestre, tão dado a oscilações de forma como um gordo a fazer abdominais perante uma pizza de queijo, mas pode trazer alguma mais-valia a um ataque com demasiada…velocidade. E ele, não a tendo, compensa com a experiência.

(+) A força extra no meio-campo. Aqui está a principal diferença do FC Porto de Lopetegui deste ano quando comparado com o do ano passado. Este meio-campo consegue vencer batalhas individuais e será sem dúvida utilizada em muitos dos jogos onde vamos precisar de combater alguns vilões musculados com outras camisolas, ao contrário do que acontecia anteriormente, onde se sacrificava a imponência física para privilegiar a capacidade técnica. Não digo que é a opção perfeita, porque apesar do bom jogo de Danilo preferia ver ali Ruben a distribuir o jogo, não contesto que o ex-Marítimo é um homem importante para garantir que uma pressão feita com bons índices físicos, somado a Imbula e, nalgumas circunstâncias, André, pode ter um efeito estupendo na recuperação de bolas no centro do terreno.

(-) Herrera. Ora bem. Não. Assim tipo não. Hell no, se fosse uma avó afro-americana do sul com chapéu de abas na cabeça e tudo. Esteve tão mal que fez lembrar uma espécie de Mariano González no meio-campo, com a desvantagem de não correr um décimo do que o argentino corria e a mostrar o mesmo ar de inépcia que o nosso anti-herói preferido tantas vezes exibia. Falhou quase tudo: o passe, a movimentação, a finalização, a criação de lances ofensivos e a recuperação defensiva. Se Lopetegui está a apostar no mexicano para ser titular, ele que me parece ser do tipo de jogadores que os treinadores gostam, os que fazem sempre o que lhes é pedido, então estamos mal, porque se o faz, fá-lo mal. Parece ainda estar cansado das poucas férias que teve e pode ser uma justificação para o jogo que teve, mas receio não ser o único factor. Herrera, neste momento, está a mais na equipa.

(-) A entrada na segunda parte Lentos, distraídos, com pouca movimentação no meio-campo e demasiadas hesitações na defesa, foi por nossa culpa que o adversário se impôs durante quase dez minutos e nos empurrou para uma sequência de perdas de bola e bolas paradas defensivas que, com o resultado em apenas 1-0, podia ter corrido mal. Já sei, sou um pessimista, mas já vi jogos a mais em que por parvoíces destas acabamos por andar a tremer até ao final da partida para sacar uma vitória a ferros. Não quero ver nada mais disso, não senhor, obrigado.


Um já está. Faltam 33. E o próximo, na Madeira, pode ser uma vitória física e moral excelente para arrancar a época em grande…

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Ouve lá ó Mister – Vitória Guimarães

Señor Lopetegui,

Bem vindo de volta ao teu estádio, hombre! Uma equipa cheia de caras novas, uma relva fresquinha, balizas pintadas, equipamentos todos shiny e uma saúde clubística que mete inveja a tantas formações por esse mundo fora. Vais ter um Dragão cheio para te saudar no regresso à competição e para apoiar a nossa demanda pela reconquista do caneco que nos foge há dois anos. Há muita pressão, muita fome, muitíssima vontade de ver o azul-e-branco a voar nas varandas, alpendres, janelas e telhados por todo o país. E tu, mais uma vez, és o escolhido para levar a nau a bom porto.

Já sei que a equipa é diferente e que perdeste metade dos titulares da época passada. Quatro indiscutíveis e o Fabiano desampararam a loja por um ou outro motivo e estás novamente a construir baseado nas tuas ideias e nos bolsos da SAD. E não podemos dizer que tenhas poucas mais-valias no plantel, mas também compreendo que possa demorar até termos uma equipa estável, afinal somos todos homens e se um gajo se desentende na fila para o Metro, é possível que em campo, com toda a movimentação e basculação e diagonalização, as coisas também abanam. Mas é imperioso começar a vencer e acima de tudo é muito importante arrancar os primeiros jogos com vitórias e não abdicar de pontos que nos possam lixar mais para a frente. Lembras-te do Boavista no ano passado? Pois é, se tivéssemos ganho esse jogo talvez não andássemos a dar cornadas contra a parede mais tarde.

Começa bem. Faz o que quiseres, usa os pés de coelho ou as ferraduras ou trevos que te der na mona. Reza a Deus, Alá, Vishnu, Horus, não quero saber. Mas ganha este jogo e continua a ganhar. A jogar bem ou mal, pouco me importa, quero é os três pontos.

Sou quem sabes,
Jorge

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Dois

FUTEBOL - durante a apresentacao do plantel do FC Porto para a epoca 2015/16. Estadio do Dragao, no Porto. Sabado, 8 de Agosto  de 2015.  (ASF/PAULO ESTEVES).

FUTEBOL – durante a apresentacao do plantel do FC Porto para a epoca 2015/16. Estadio do Dragao, no Porto. Sabado, 8 de Agosto de 2015. (ASF/PAULO ESTEVES).

Não bastava o passado que carregas às costas, ainda te somaram o número. Muito bem, caríssimo, eis o histórico que tens de atravessar para que esse “2” seja honrado:

 

1995/1996 João Pinto
1996/1997 João Pinto
1997/1998 Jorge Costa
1998/1999 Jorge Costa
1999/2000 Jorge Costa
2000/2001 Jorge Costa
2001/2002
2002/2003 Jorge Costa
2003/2004 Jorge Costa
2004/2005 Jorge Costa
2005/2006
2006/2007 Ricardo Costa
2007/2008 Bruno Alves
2008/2009 Bruno Alves
2009/2010 Bruno Alves
2010/2011
2011/2012 Danilo
2012/2013 Danilo
2013/2014 Danilo
2013/2014 Danilo
2014/2015 MAXI PEREIRA
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O regresso

Fui ao Dragão no passado sábado. As saudades já apertavam e crescia a necessidade do contacto com aquele monte de betão e ferro que ilumina a minha alma e me arrasta para horas de fun, fun, nail-biting fun com que quinzenalmente sou presenteado de Agosto a Maio. Estava uma bela tarde, solarenga como poucas, com o calor do astro a fazer subir a minha já alta temperatura e a vontade do regresso da competição que parece ter terminado há anos. Desde aí já vi dezenas de horas de futebol, algumas com despreocupado prazer pelo futebol e pela beleza deste jogo que adoro.

Gosto mais de rever os antigos do que conhecer os novos. Sempre fui assim, com o particular interesse pelas panças dos gajos que chegam de férias, algo que parece limitado a meia-dúzia de desafortunados que têm de pedalar mais no ginásio ou de dar mais voltas ao centro de treinos que os outros, os cabrões dos sortudos que não incham nas férias. Como faço parte daquele pedaço de povo com inchaços independentes, isto é, engordo de férias ou fora delas, tenho um particular apreço por aqueles que me fazem lembrar o Rui Filipe, ele que aparecia sempre num estado pós-Verão a roçar o risível. Tinha sempre uma barrigona de cerveja e camarão e francesinhas e sei lá mais o que é que o moço enfardava nas férias e só lá para Outubro ou Novembro é que estava em condições para jogar ao ritmo dos outros. No ano em que finalmente parecia ter regressado com peso bem controlado…enfim, RIP, rapaz.

Entre a míriade de emigrantes regressados e sequiosos por um bocadinho do Porto e de Porto, passou-se uma tarde simpática. Não sou adepto do fausto da apresentação nem do espectáculo feito para o público transitório que não representa nem de perto os que lá vão estar em todos os jogos a sofrer e a viver o progresso da equipa. Não faz deles menos portistas, apenas menos presentes. Foco-me nos rapazes de azul-e-branco no relvado, na saudação do seu regresso e na recriação do elo que nos une e que nos vai continuar a unir nos próximos meses. É a catarse da solidão competitiva, o acender da vela que nos iluminará por desfiladeiros profundos e rios escuros, que nos trará o êxtase da alegria ou a lamúria da tristeza. É o futebol, o meu futebol, de volta.

E, tal como ele, também regresso eu.

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