Antes da festa, houve jogo. E houve um jogo que não vai desaparecer tão cedo das mentes de um portista que se preze, porque a vitória de hoje foi o limpar de uma imagem que tinha sido deixada após o confronto da Taça no Dragão que perdemos (e muito bem) por 2-0, e que fora explorada até exageros de proporções bíblicas pela imprensa e seus doutos opinadores. Foi um jogo em que mostrámos em campo, na relva, que somos os melhores. Somos os melhores porque quisemos vencer mais do que o adversário o quis impedir. Porque usamos a arma que nos tinha ferido com gravidade (a pressão alta) contra o Benfica, magoando-o sem opção de recobro. Porque houve garra, luta, espírito de sacrifício, capacidade de auto-controlo perante a ridícula exibição de Duarte Gomes, numa das piores arbitragens que me lembro desde Paixão em Campo-Maior, com erros para ambos os lados mas em claro prejuízo da nossa equipa. Porque vencemos em casa do adversário quando o adversário, no ano passado, não o conseguiu fazer. Foi essa vontade, essa alma, que me conquistou. Parabéns, malta! Notas abaixo:
(+) Otamendi Se este é o Nico que vamos ter até ao fim da época, se calhar vendemo-lo no Verão. Esteve brilhante em todo o jogo, especialmente no lance do penalty, em que não perdeu a cabeça depois de ver a decisão aberrante de Duarte Gomes mas continuou a trabalhar, a cortar bolas fundamentais e a sair bem com a bola controlada, só para ser novamente injustiçado pela besta de preto num amarelo infundado por uma falta que não existiu e que só no futebol português é que alguma vez se podiam lembrar de marcar. Rolando, ao seu lado, joga melhor, o que não é dizer pouco, já que Rolando só joga bem quando tem ao lado um central melhor que ele. Está tudo dito.
(+) Varela Foi o jogador que mais gostei de ver, especialmente porque mostrou inteligência, astúcia e uma capacidade física que não o via a exibir há meses. Foi brilhante na subida pelo flanco de Airton, aproveitando a inadaptação natural do rapaz à posição de defesa-direito mas não só, porque recebia bolas em zonas mais recuadas, porque esperava pelo apoio de Álvaro na altura certa e na proporção correcta. Foi o principal homem do ataque portista hoje na Luz e saiu por questões tácticas, cansado mas de certeza ciente do papel fundamental que teve no jogo.
(+) Moutinho O maestro da equipa está de volta às boas exibições. Encheu o campo na primeira parte com o empenho e a inteligência da pressão que ia orquestrando e na segunda parte foi o principal autor da troca de bola que levou o Benfica a cometer erros atrás de erros e só não fez com que o FC Porto marcasse mais golos por clara inépcia de Falcao hoje em Lisboa. Arriscou no final numa entrada a pés juntos que podia (e talvez devesse) ter levado um vermelho e não um amarelo, o que censuro mas compreendo. Afinal, quando se sai do Sporting para ser campeão, o rapaz faz tudo para ganhar logo à primeira.
(+) Helton Brinca muito. Finta os avançados. Pica a bola por cima dos adversários. Queima tempo. E então? É o nosso capitão, campeão e líder de balneário. À defesa que faz ao remate de Aimar ainda na primeira parte somam-se mais algumas intervenções seguras no segundo tempo e a certeza que a confiança estava em alta (o que nem sempre é bom com o nosso keeper, né moleque?) e que essa mesma confiança se transmitia para os colegas. Excelente.
(+) Villas-Boas Muito, mas muito bom. A conferência de imprensa, onde surgiu um treinador feliz, sorridente, que parecia ter saído de um banho de espumante que aposto levou no balneário, mostrou o que significa ter um treinador portista a celebrar um título no Estádio da Luz. O que significa, acima de tudo, ter um treinador portista. Devia ter gravado o raio da emissão.
(-) Passividade do Benfica Fiquei surpreendido e até um pouco decepcionado com a atitude do Benfica. Muito à imagem do que o FC Porto tinha feito no jogo da Taça, foi um Benfica amorfo e que parecia desinteressado em impedir, como lhes era exigido, que pudéssemos ser campeões na Luz. Foi uma fraca exibição e acima de tudo foi uma exibição abaixo do que podem fazer. Mérito para a nossa equipa porque a pressão alta fez com que não houvesse espaços para circular a bola para a frente e obrigou a atrasos sucessivos para o guarda-redes, mas não explica tudo. O orgulho que tive na minha equipa em Março de 2010, quando forçámos a que o Benfica tivesse de sair do Dragão sem o título no bolso deve ser equiparado à desilusão do lado dos adeptos vermelhos pela forma como permitiram que o campeonato fosse entregue no seu próprio campo ao principal rival.
(-) Duarte Gomes Se colocássemos uma couve-lombarda a apitar este jogo, era mais provável que a nota fosse positiva. É evidente que o jogo era do mais difícil que podia haver, mas para o futuro tenho de guardar as decisões que tomou e que vão obviamente ser escondidas pela imprensa nos próximos dias. Para lá da quantidade absurda de cartões amarelos exibidos, fica o penalty marcado a Otamendi onde não há falta; o amarelo a Roberto no penalty contra o Benfica é curto; o segundo amarelo a Otamendi é absurdo, porque não há falta; Aimar deveria ter sido expulso logo nos primeiros dez minutos de jogo por várias entradas violentas; idem para Coentrão; idem para Javi; idem para César Peixoto. Podia continuar aqui a falar de Duarte Gomes por horas e horas. Não vou gastar nem mais um segundo.
(-) Apagões, bolas de golfe e animalices Condeno a atitude do Benfica, até porque já fiz o mesmo depois de ver alguns comportamentos do género no meu próprio estádio. Tanto a nível de segurança como de fair-play, é neste tipo de situações que podemos ver que os comentários de João Gabriel e Rui Gomes da Silva são prova do ridículo em que as pessoas acabam por cair quando criticam a postura contrária e se alheiam de olhar para a sua própria casa, para além das bolas de golfe e bilhar que choveram nos pontapés de canto. O apagão, em termos de segurança, é mau. Em termos de fair-play, não é mais do que estava à espera.
Hesitei entre correr os jogadores todos com notas positivas mas raramente sou dado a atitudes salomónicas e tal far-me-ia perder a isenção e a forma crítica como julgo os jogos do FC Porto. Mas fiquei tentado, porque quase todos jogaram bem hoje à noite. Sei que não há tempo para celebrar em grande porque há outros jogos muito importantes para disputar, o primeiro dos quais já na quinta-feira no Dragão contra o Spartak. Mas o campeonato, aquela prova que nos envolve todo o ano e a única que verdadeiramente interessa vencer todos os anos (já que as provas europeias são utopias pontuais)…essa, já cá canta!